sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Professores ao longo da vida


Todo mundo tem exemplos de professores que influenciaram a gente, de uma maneira ou de outra, né? Aquele professor bacana que conseguiu até fazer vc gostar de uma matéria chata, ou aquele professor cretino que corrigia prova de acordo com o humor, e tirava ponto de quem não gostava.
Como em todas as profissões, tem gente que não é competente, e tem gente que não tem ética.

Aqueles que realmente marcam positivamente, são os que, além de saberem do que falam, gostam do que fazem, são inteligentes, têm talento pra fazer da explicação algo fácil (se puder fazer divertido, melhor).
Porque ser bom professor não é só dominar o assunto, é preciso saber passar o conhecimento adiante de forma que capte o interesse do aluno. E pra isso, eu acho que precisa talento sim.

Tive uma professora que me marcou nesse sentido. Ela era uma senhora, já pelas casa dos 6o anos, indo para os 70. Era sóbria, não era "bem humorada", não era "truta" dos alunos, detestava conversas e interrupções, chamava a atenção dos alunos.
Ela chegava lá, dava a aula dela, sem piadas, sem brincadeiras. Mas explicava maravilhosamente bem. De uma forma simples, completa, que não deixava margem para dúvidas.
Foi a primeira vez que eu comecei a me interessar por história. Que as coisas começaram a fazer sentido. Que os eventos ficaram interessantes, e que eu pude notar que eles aconteciam de forma linear, entender que "causas" e "consequências" não eram apenas 2 listas em lados opostos da página do livro, a serem decoradas.

Nem todo mundo gostava da Professora Rosa, claro. Se vc conversasse durante a aula e fosse criticado ou expulso de sala, vc provavelmente a rotularia de megera. Mas pra quem um dia se deu ao trabalho de prestar atenção ao que ela dizia por 5 minutos, tenho certeza que pensa como eu. Na aula dela eu não fazia questão de piada, de conversar, de nada. Eu só queria ouvir o que ela tinha pra me contar, e depois ficava esperando a aula seguinte, como quem espera o próximo capítulo de uma série bacana.

Um dia ela pediu que a turma (estávamos na 6ª ou 7ª série, não lembro mais) fizesse um desenho: uma tribo de índios. Creio eu que era algum tema idiota passado pelo colégio para o dia do índio, ou algo assim. Cheia de orgulho, eu fiz um puta desenho, todo caprichado e cheio de detalhes.
Pô, eu desenhava bem, todo mundo se impressionava, comentava. E a Professora Rosa nunca havia falado comigo (ela não era dada a essas coisas, rs), e eu não tinha coragem de chegar nela e dizer o quanto eu gostava da aula. Porque eu tenho certeza que a professora Rosa torceria o nariz pra "puxa-saquismo" (imaginem uma nanny inglesa, essa é a imagem que eu faço dela). Então eu vi no desenho a oportunidade de mostrar meu apreço pela aula dela. Se ela fazia um trabalho tão bom explicando, eu faria um trabalho igualmente bom com a tarefa que ela havia passado.

Ela foi passando de mesa em mesa (sim, ela era daquelas que checavam cada aluno individualmente) verificando os desenhos, sem comentar nada, apenas abananando a cabeça como em sinal de "ok, tarefa cumprida" para cada aluno. Quando ela chegou na minha mesa, parou. Olhou pro desenho durante um bom tempo. Eu me enchi de orgulho. E então ela me olhou nos olhos e perguntou:
_o que é isso? _ com um quê de indignação.
Gelei na cadeira. Eu só conseguia pensar no quanto eu havia colocado de dedicação no desenho, cuidado dos detalhes, etc... Por que ela não havia gostado??

_ Isso é um índio americano. Por que vc desenhou um índio americano?
Eu queria responder "ué, porque índio é índio, tanto faz", mas eu sabia que não era uma boa idéia. Além disso, eu também poderia dizer que, no afã de impressioná-la com meus dotes artísticos, escolhi fazer os índios mais enfeitados, com mais detalhes, etc. Porque vamos combinar que uma roupa de franjinhas é mais bacana graficamente que uma tanga, né? Em vez disso, eu fiquei tão decepcionada, meu balão desinflou tão rápido, que eu só consegui balbuciar algo como:
_ Não sei. Achei bonito.

Não sei se ela notou minha decepção, se ficou com pena, whatever... Mas a expressão dela se suavizou na hora, e ela me disse que sim, os índios americanos eram bonitos, mas os brasileiros também. Disse que eu podia desenhar os índios tocando instrumentos na frente da oca, ou andando de canoa no rio, me deu algumas idéias. E lembrou que o desenho era para homenagear o índio do Brasil, por isso não fazia sentido desenhar índios que não os "nossos" (dêem um desconto pros termos do diálogo, o mundo era politicamente incorreto naquela época).

Bastante envergonhada, mas mais calma, eu refiz o desenho e levei pra ela, no final da aula. Ela sorriu e elogiou.

Acho que foi uma dos primeiros exemplos que eu tive de incentivo baseado em reforço positivo, ao invés de reprimenda.
Talvez, um professor "bacana" e amigão da moçada tivesse zoado meu trabalho, me humilhando perante a turma. O que não ia melhorar em nada a minha vontade de continuar o trabalho, muito menos a minha opinião de criança sobre os "nossos" índios. (heh)
No entanto, a professora austera e sem senso de humor, teve sensibilidade pra me corrigir sem me detonar, inclusive sugerindo idéias que eu sozinha nao tive.

Acho que essa foi a única vez que falei com ela assim, diretamente (claro, sem contar dúvidas em sala de aula, etc). Ela não era exatamente uma figura convidativa e maternal, rs. Mas sempre a admirei de longe, e ela foi a responsável por eu gostar de história até hoje.

Da próxima vez eu conto o outro lado, a história da pior lembrança que eu guardo de um(a) professor(a).

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