domingo, 28 de março de 2010

For you will still be here tomorrow, but your dreams may not

Crédito da imagem: Indo Além

Todo jovem eventualmente recebe conselhos de pessoas mais velhas e sem dúvida pensa “ah, nada a ver, isso era na sua época” ou “comigo vai ser diferente” ou “eu não sou assim” ou “quem sabe o que é melhor pra mim sou eu”.

É uma pena que ele só vá apreciar e valorizar esses conselhos e ensinamentos mais tarde. Em alguns casos, simplesmente tarde demais. Em outros, ainda dá pra fazer algo a respeito, mas o arrependimento fica por conta do tempo perdido. E perdido de bobeira, por ingenuidade (quando não por arrogância).

O Brasil não é um país de oportunidades, é um país de miseráveis. O que é artigo de primeira necessidade já é considerado luxo. Imagina então o resto.
Aqui, ser bom no que se faz não é garantia de nada. Sucesso depende mais de sorte (estar no lugar certo, na hora certa, conhecer as pessoas certas) do que de competência. Porque ainda que existam poucas pessoas realmente capazes, existem ainda menos oportunidades decentes.

Se eu soubesse o que eu sei hoje, jamais teria feito a faculdade que fiz. É burrice, num país como o Brasil, abraçar uma carreira que não seja regularizada. Se as que o são, já são uma zona, imagina uma que nem precisa de diploma pra ser exercida. Brasileiro não dá valor a serviço. Ele também mal dá valor a produtos, mas pelo menos os valoriza um pouco mais. É algo que ele entende, que ele pode pegar na mão, sentir o peso, imaginar o custo do material e da produção. Mas serviço, esforço, talento, criatividade, valor do tempo empregado, custos indiretos? São coisas que o brasileiro não compreende e não respeita.
Isso só piora com o fato de qualquer um poder bater no peito e dizer que faz o mesmo que vc, mesmo não tendo estudado, sem ter o menor talento, nem saber o básico. Nivela a profissão por baixo, desvaloriza o trabalho.

A segunda burrice foi tentar (e principalmente, COMEÇAR) a carreira de forma independente, como empresária, em vez de contratada em um lugar qualquer. Se jogar no vácuo assim sem antes fazer contatos no meio, sem ter nem uma potencial cartela de clientes, foi mais que burrice. Foi loucura. Sem ter ninguém conhecido na área, ficar esperando que clientes caíssem do céu, sem saber como vender um serviço não solicitado a alguém que não te conhece… Deus, só sendo jovem mesmo pra não ter a exata noção de como isso é arriscado e estúpido. É aquele negócio: fazer odonto tendo pai dentista é uma coisa. Fazer odonto na careta, sem grana pra montar consultório, é outra.

O começo deu errado (é aqui que vc já-não-mais-tão-jovem olha e fala “nossa, jura?” rs)  e, entre vários problemas – entre eles uma depressão que durou muitos anos – eu me perdi. As coisas, até por questão de necessidade, enveredaram por um caminho que me desanimou (odeio, odeio web).
Curiosamente, no meio disso tudo eu me animei com um projeto específico e improvável e, apesar das circunstâncias, tive sucesso. O tal do “hora certa no lugar certo”, aliado à competência.

É, deu certo. Mas os frutos se escoaram no ralo de dívidas remanescentes da época de fracasso e de projetos em companhia de gente incompetente e irresponsável.
Engraçado que a maior mágoa que ficou desse período foi a viagem que eu queria fazer e não fiz. Era simples, era possível, era a recompensa, era a forma de aproveitar, era a única coisa que podia ser boa em muito tempo, depois de tanta privação. Mas… Não era pra ser. Por motivo nenhum, por nada, só por falta de boa vontade mesmo. Mas não era. Paciência.

Daí, como se isso não fosse o bastante, eu mudei minha vida. Toda. Ou quase. A única coisa que eu não mudei foi a profissão. Tive a pachorra de começar de novo, com mais de 30 anos. Não muito mais amparada do que antes, se dá pra acreditar. Com mais experiência, com certeza, mas com o mesmo tanto de clientes. rs.
Dessa vez eu não excluí caminho nenhum, considerei todos. E experimentei todos. Freela, inciativa privada. Ganhei ainda mais experiência, um puta portfólio (que nunca atualizo, mas enfim), confiança, e elogios por onde passei e pra quem trabalhei.
E aí eu vi que, apesar de ter curtido bastante fazer alguns trabalhos, eu na verdade não gosto da minha profissão. Vi que a parte realmente gostosa, a criação, é a que leva menos tempo, consome menos esforço, e corresponde a no máximo 10% do trabalho. O resto é aporrinhação, prazos insanos, invasão do meu tempo livre, negociação, revisão, cobrança, ficar de babá do trabalho dos outros, etc.

Como dizem por aí, nada melhor pra tirar a graça do que vc gosta do que transformar isso em trabalho. Trabalho é obrigação, não lazer. Então, whatever. Que pague bem, que tome o mínimo de tempo livre e dê o mínimo de aporrinhação. Quanto melhor o equilíbrio entre esses 3 requisitos, melhor o trabalho. Se paga MUITO, vc aguenta um tanto de aporrinhação. Se aporrinha demais e toma muito tempo livre, talvez mesmo por muito dinheiro não valha a pena.

Olhando pra trás, eu vejo o quanto de idealismo infantil me fez seguir esse caminho e descartar os conselhos do meu pai. Eu era ingênua e romântica e achava que “fazer aquilo que se ama” era mais nobre, era mais digno, tinha mais valor. Pfffffff, quanta besteira.
Hoje, que eu tenho nojinho desse idealismo moloide, é que eu vejo que não há nobreza nenhuma em ficar aturando cliente tentando reduzir seu preço como quem negocia em xepa de feira. Que fazer um trabalho que vc SABE que é horroroso só porque está recebendo pra isso, não te faz mais digno do que qualquer outra pessoa que vai pro emprego fazer o que tem que fazer e pronto. E que o seu trabalho tem o valor que vc recebe por ele, tanto faz se vc o ama ou se caga e anda pra ele.

Triste de quem se define pelo trabalho que faz, de quem precisa desempenhar uma função específica pra saber quem é e o valor que tem.

Então, que diferença faz? Mais vale aproveitar a melhor equação. E eu tenho que concordar que trabalhar de 9 às 6, sem hora extra, sem cliente pechinchando, sem se preocupar em levar calote nem em receber atrasado, sem ficar à mercê de humor de chefe maluco e crise financeira, com férias e décimo terceiro, financiamento pré-aprovado, plano de saúde e aposentadoria integral, e ganhando BEM, é uma equação vantajosa, que merece respeito.

Anyway, eu não escrevi isso pra decidir nada. E sim porque agora eu não só reconheço que meu pai estava certo, como imagino a agonia que ele deve ter passado assistindo às minhas cabeçadas, enquanto deixava eu seguir meu caminho e me apoiava do jeito que podia. E porque eu sei que eu POSSO decidir o que eu quiser, se eu quiser, sem medo de estar perdendo nada.
Talvez fosse desse processo que eu precisava. Fazer as coisas sozinha, me sentir capaz e saber que eu sou uma das boas naquilo que escolho fazer. Seja o que for.
Agradeço a vida que eu tenho, que me dá a oportunidade de poder tomar esse tipo de decisão. Conscientemente, sabendo que tenho apoio. Tem gente que não pode se dar ao luxo.

Agradeço também ter amadurecido e perdido o orgulho cego e imaturo e ganhado serenidade e um pouco de sabedoria. Normalmente essas coisas vêm com a idade, mas nem sempre.

Um comentário:

Leandro disse...

Não tem ninguém que não tenha "feito o que queria" quando era novo, e depois percebido que a estupidez típica da juventude estava falando mais alto que o bom senso que só a idade traz; uma vez eu li que o ser humano só aprende pela experiência, QUANDO aprende.

Também pela questão da sorte, para uns esse aprendizado custa mais que para outros.

Bola pra frente; tudo que nós temos na vida é o presente e o futuro, e, dos dois, somente um pode ser alterado pelos nossos esforços. E isso, nenhuma bobagem tira da gente.